Mostrando postagens com marcador Sociedade e surtos modernos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Sociedade e surtos modernos. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 3 de julho de 2025

O limite do fazer e o ápice do ser

 





Assisti ao vídeo como quem presencia uma aula, mas recebi como quem leva um espelho no rosto. Marina Silva,sentada, fala com a tranquilidade de quem entende o caos. Fala do capitalismo — não como um inimigo a ser xingado, mas como uma engrenagem tão precisa que nos esmaga sem percebermos. Fala da lógica que nos ensinou a valer pelo que produzimos, não pelo que sentimos. A valer pelo que acumulamos, não pelo que sustentamos em silêncio.


É curioso como ela diz tudo sem levantar a voz. Há algo de sereno em quem não precisa provar que está certo. Ela diz que as coisas estão erradas. E ponto. Não há espetáculo, só lucidez. E lucidez, hoje, é quase subversiva.


Enquanto ela fala, eu penso: quantas vezes a gente se esforça pra fazer, pra entregar, pra render. Quantas vezes confundimos valor com utilidade. Trabalhamos até a exaustão, estudamos até o desespero, acumulamos metas como se a vida fosse uma escada — e não um campo. Vivemos correndo sem saber de quem, ou atrás de quê.


Marina diz que o capitalismo nos ensinou a descartar. E não está falando só de objetos, mas de gente. O corpo que adoece. O velho que já não rende. A mulher que para de agradar. A criança que não aprende no tempo da máquina. Tudo que não produz rápido, tudo que não encaixa, vira resto.


Nesse ponto, ela não está apenas falando de política ou economia — está falando de vida. E da morte lenta de quem só aprendeu a existir produzindo. A gente se esquece que é possível ser sem se mover. Respirar e ainda assim merecer estar aqui.


Enquanto assisto, percebo que ela não está dizendo nada que eu já não saiba. Mas ela tem coragem de dizer. Em voz alta. No meio de um sistema que ainda espera que a gente cale e sorria. Que a gente poste, venda, entregue, se reinvente — como se a pausa fosse falha.


Ela lembra que há um ponto onde o fazer se esgota. Onde já não há mais resultado. Nem sucesso. Nem meta. Só a alma nua, esperando não ser descartada também.


E talvez esse seja o ápice do ser: aquele momento em que você entende que não precisa provar nada. Que estar viva já é suficiente. Que há dignidade em ser. Em parar. Em não render.


Marina fala com uma calma que atravessa. E eu fico aqui, com a sensação de que alguma coisa em mim também falou — sem dizer uma palavra.


sexta-feira, 6 de junho de 2025

Somos escravos de sonhos que não sonhamos

Nem tudo que você deseja é seu — às vezes é só o sistema usando sua cabeça.



 Carro, celular, banco, bebida… tudo é apresentado como essencial. Mas no fundo, são desejos implantados. Propagandas fantasiadas de necessidade. O consumo se tornou religião e o estilo de vida, uma coleira. A maioria sonha com o que viu numa vitrine ou no feed. Nada disso é genuíno. É apenas combustível para um sistema que precisa de gente desejando coisas que não precisa — pra continuar girando, sugando tempo, energia e identidade.

E no fim do dia? A engrenagem revela seu lado mais raso: tudo gira em torno da validação. Do sexo. Da conquista. Da imagem. Homens fantasiam carros não pela função, mas pela ideia de que isso abre portas para o prazer. E não é mentira. Muitas mulheres ainda se colocam como prêmio de consumo, como se um banco de couro justificasse a entrega do próprio corpo. Não julgo, mas observo: isso diz muito mais sobre o vazio que tentam preencher do que sobre o objeto em si.

A desculpa biológica vem sempre pronta: dizem que mulheres “preferem homens com status” e que homens querem “o máximo de mulheres possível”. Mas essa explicação rasa ignora o peso cultural da desigualdade histórica entre gêneros. Essa não é a natureza humana, é o condicionamento. Desde cedo, homens são ensinados a medir valor por poder e acúmulo, e mulheres a vender afeto em troca de segurança. O desejo foi manipulado, doutrinado, dirigido. Quando você repete que isso é “natural”, só está normalizando uma estrutura que favorece os mesmos de sempre — e que nunca foi neutra, nem justa.


Chamam esse tipo de pensamento de ideologia , mas o fato mesmo é o mundo onde a única coisa que funciona é o acúmulo. Onde poucos têm muito e muitos não têm nada — e ainda são convencidos a agradecer por isso. O comunismo não falhou, ele foi sabotado. Assusta justamente porque propõe redistribuição num sistema que sobrevive do desequilíbrio. Não é utopia achar que todos merecem acesso ao básico, é delírio acreditar que só é possível viver bem às custas do sofrimento alheio.


Dizer que “na prática não funciona” é fechar os olhos para o fato de que o capitalismo também não funciona — a não ser que você esteja no topo da cadeia. Enquanto isso, há gente morrendo de fome ao lado de supermercados lotados. A verdade é que ideias saudáveis incomodam porque desmontam privilégios. E liberdade real exige confronto com as verdades que preferem esconder sob o tapete do conforto.

Não sonho com o que me mandaram sonhar. Isso não é comunismo, é lucidez. A liberdade começa quando você para de confundir ter com ser.

Em fim vou dormir. Que é de graça, e ainda me protege dos delírios do sistema.


quarta-feira, 28 de maio de 2025

EP 2 - Selva de pedras, coração de concreto

 O que eu vi quando todo mundo olhava para frente 



Eu tinha acabado de chegar em São Paulo. Fazia poucos meses e tudo ainda era novidade. A cidade gigante, os prédios absurdos, as luzes, os cheiros, as pessoas — tudo em excesso, tudo vivo. Fui ao centro, como quem quer conhecer o coração de SP. E que coração estranho.

Tantas coisas bonitas. Arquitetura imponente, lojas, música, comida por todos os lados. Era tudo tão rápido. Um entra e sai de gente, passos apressados, olhos grudados nos celulares, nos relógios, nos próprios mundos. Mas no meio desse movimento todo, o que mais me chamou atenção… foi o que estava parado.

Os moradores de rua.

Eles estavam ali, como se estivessem presos numa outra velocidade. Em câmera lenta, enquanto o resto da cidade parecia acelerado em 2x. Cobertores rasgados, sujos, corpos deitados no chão frio, olhares perdidos. Não havia urgência neles. Nem pressa. Nem direção. Só existência.

E o mais estranho é que ninguém os via. Ou fingia não ver. As pessoas desviavam como se fossem postes, obstáculos. E seguiam. Rápidas, eficientes, focadas. Ninguém parecia se perguntar: quem são essas pessoas? Por que estão aqui? O que aconteceu com elas?

São Paulo não era a cidade das oportunidades?Passei por um, por outro. Um cachorro ao lado. Um papelão improvisado como cama. Um saco de roupas. Um pedaço de pão seco na mão. E a vida… continuava.

Quando cheguei em casa, não estava mais tão maravilhada. A tal “selva de pedra” começou a fazer sentido. Onde o filho chora e a mãe não vê. Onde a dor é abafada pelo barulho. Onde o que incomoda é simplesmente ignorado.

Mas São Paulo também é isso: o berço de maloqueiro bom, como dizem. Gente que luta, que corre atrás, que resiste. Inclusive eles. Os que dormem na rua. Os invisíveis. Porque não escolheram lutar do lado certo ou do lado errado — escolheram viver. Da forma mais difícil.

E, pensando bem… talvez eles tenham menos preocupações que a gente. Não pagam boleto, não batem ponto. Mas a luta deles é outra. É interna. E a mente, ah… a mente não tira folga. Trabalha 24 horas, sem hora extra, sem fim de semana. Lutar com o mundo já é difícil, mas lutar com você mesmo é mil vezes pior.

Essas pessoas são guerreiros. Guerreiros de si mesmos. Das batalhas silenciosas, das dores que ninguém quer ver, da invisibilidade, da fome, do frio, da sede, do calor, da vida.


EP 1 -Além da sujeira


 É fácil desviar o olhar. Mais fácil ainda é julgar. Os moradores de rua incomodam a paisagem, atrapalham o caminho apressado, causam desconforto por serem a lembrança viva de tudo que fingimos que não existe. Gente que perdeu o chão — às vezes aos poucos, às vezes de uma vez só. Gente que já foi como nós, e talvez ainda seja, só que do lado de fora da vitrine.

Ali, no meio do concreto, entre restos de papelão, a dignidade vai minguando junto com a esperança. Eles não sonham mais com estabilidade, carreira ou futuro — apenas com a próxima refeição. Um banho quente. Um rosto que não os veja como bicho. A rua se torna o lar porque todas as outras portas se fecharam.

Mas e nós? Que nos olhamos no espelho e tentamos disfarçar o cansaço com mais uma meta, mais um diploma, mais um “like”? Somos mesmo tão diferentes?

Vivemos num ciclo doentio: correr atrás do que não precisamos, exibir o que não somos, comprar o que não podemos, competir para manter o lugar numa corrida que não leva a lugar nenhum. O vício de ter. A roda gira, gira, gira. E dentro dela, nós. Robôs movendo engrenagens.

“A ânsia de ter e o tédio de possuir.” A frase é de Gustavo Barroso, e define perfeitamente o que nos tornamos. Alcançamos o que tanto queríamos e, logo depois, sentimos o vazio. É por isso que o processo importa mais que a conquista. É o que nos mantém vivos. Ou pelo menos distraídos da falta de sentido.

Os moradores de rua já passaram por isso. Já tentaram. Já correram. Até que cansaram. Ou foram empurrados. Ou tropeçaram e não houve quem estendesse a mão. Eles estão ali, não por escolha, mas porque o sistema não comporta os fracos, os doentes, os que falharam em performar o sucesso.

E a pergunta que fica é: somos melhores por estarmos do lado de cá? Ou somos apenas marionetes bem arrumadas de uma engrenagem desumana?

Talvez fôssemos mais felizes antes de tanta modernidade. Quando bastava caçar, colher, comer, viver. Quando o mundo era difícil, mas não cruel. Hoje, a busca por funcionalidades pra preencher vazios que não têm nome virou obrigação. E, no fim, seguimos todos exaustos, vazios e fingindo que está tudo bem.

A diferença entre nós e eles pode ser menor do que gostamos de admitir. E talvez, no fundo, o que mais nos incomoda neles… seja ver o quanto ainda há de nós ali.


segunda-feira, 19 de maio de 2025

Já percebeu como a gente sempre acha alguma coisa pra fazer, menos o que realmente importa?

Você senta pra escrever aquele texto, responder aquele e-mail, arrumar a vida… e de repente tá lavando colher, reorganizando a gaveta de meia ou vendo vídeo de gente que acorda às 5 da manhã pra correr. Aí vem o combo: culpa, ansiedade e aquela voz na cabeça dizendo “você podia estar fazendo algo útil”. Mas útil pra quem?

Procrastinar não é só preguiça — às vezes é medo. Medo de começar e não dar conta, de tentar e falhar, de se decepcionar. E aí a gente paralisa. Se sente um lixo por não produzir, mas também morre de medo de produzir algo ruim. Resultado? Nada acontece. E mesmo assim a gente se cobra como se tivesse que ser uma máquina de utilidade máxima 24/7. A real é que tá tudo bem não ser produtivo o tempo todo. Às vezes, o passo mais difícil não é nem fazer — é só começar. E tudo bem se não for perfeito. Pior do que errar é nunca ter tentado. Então respira, fecha o TikTok (só um pouquinho) e faz só um pedacinho. Já é mais do que nada.

E se quiser uma forcinha, aqui vão 5 passos rápidos e sem enrolação pra dar um chega pra lá na procrastinação:

1. Regra dos 2 minutos: se leva menos de 2 minutos, faz agora. Nada de deixar o simples virar monstro.

2. Técnica Pomodoro: 25 min de foco total + 5 min de descanso. Repete. É tiro curto, mas rende.

3. Tira da cabeça, põe no papel: lista tudo. Só de ver o caos organizado já dá um alívio.

4. Começa pelo mais fácil: cria ritmo. Uma tarefa feita gera energia pra próxima.

5. Se perdoa e continua: escorregou? Normal. Só não transforma um tropeço numa semana parada.

Não precisa virar outra pessoa. Só precisa começar de onde tá, com o que dá. O resto vem.



Entre o corpo e a alma— Resquícios

Sentir, logo cedo, o pulsar do meu coração mais acelerado que antes. Ao abrir os olhos, percebo mais um lindo amanhecer. Estou imóvel por um...