Assisti ao vídeo como quem presencia uma aula, mas recebi como quem leva um espelho no rosto. Marina Silva,sentada, fala com a tranquilidade de quem entende o caos. Fala do capitalismo — não como um inimigo a ser xingado, mas como uma engrenagem tão precisa que nos esmaga sem percebermos. Fala da lógica que nos ensinou a valer pelo que produzimos, não pelo que sentimos. A valer pelo que acumulamos, não pelo que sustentamos em silêncio.
É curioso como ela diz tudo sem levantar a voz. Há algo de sereno em quem não precisa provar que está certo. Ela diz que as coisas estão erradas. E ponto. Não há espetáculo, só lucidez. E lucidez, hoje, é quase subversiva.
Enquanto ela fala, eu penso: quantas vezes a gente se esforça pra fazer, pra entregar, pra render. Quantas vezes confundimos valor com utilidade. Trabalhamos até a exaustão, estudamos até o desespero, acumulamos metas como se a vida fosse uma escada — e não um campo. Vivemos correndo sem saber de quem, ou atrás de quê.
Marina diz que o capitalismo nos ensinou a descartar. E não está falando só de objetos, mas de gente. O corpo que adoece. O velho que já não rende. A mulher que para de agradar. A criança que não aprende no tempo da máquina. Tudo que não produz rápido, tudo que não encaixa, vira resto.
Nesse ponto, ela não está apenas falando de política ou economia — está falando de vida. E da morte lenta de quem só aprendeu a existir produzindo. A gente se esquece que é possível ser sem se mover. Respirar e ainda assim merecer estar aqui.
Enquanto assisto, percebo que ela não está dizendo nada que eu já não saiba. Mas ela tem coragem de dizer. Em voz alta. No meio de um sistema que ainda espera que a gente cale e sorria. Que a gente poste, venda, entregue, se reinvente — como se a pausa fosse falha.
Ela lembra que há um ponto onde o fazer se esgota. Onde já não há mais resultado. Nem sucesso. Nem meta. Só a alma nua, esperando não ser descartada também.
E talvez esse seja o ápice do ser: aquele momento em que você entende que não precisa provar nada. Que estar viva já é suficiente. Que há dignidade em ser. Em parar. Em não render.
Marina fala com uma calma que atravessa. E eu fico aqui, com a sensação de que alguma coisa em mim também falou — sem dizer uma palavra.

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